Redação do Site Inovação Tecnológica – 26/08/2016
Desvio das leis da Termodinâmica
De acordo com as leis básicas da termodinâmica, se você tirar um bolo do forno e deixá-lo sobre a mesa para esfriar, depois de algum tempo o bolo atingirá a mesma temperatura do ar ambiente.
Os químicos e físicos podem até gostar de bolos, mas eles preferem esfriar amostras de partículas carregadas, ou íons, porque isso os torna mais fáceis de controlar e estudar.
Para isso, eles usam uma abordagem um pouco mais trabalhosa – chamada resfriamento com gás amortecedor (buffer gas cooling) -, aprisionando os íons e, em seguida, mergulhando-os em nuvens de átomos frios. As colisões com os átomos desse gás amortecedor esfriam os íons através da transferência de energia dos íons para os átomos do gás.
Mas uma nova pesquisa demonstrou agora que os íons nunca se resfriam até a temperatura do gás circundante. Além disso, e muito surpreendentemente, descobriu-se que existem pelo menos duas temperaturas finais, e a temperatura que os íons “escolhem” depende da sua temperatura inicial.
“Este aparente desvio das leis familiares da Termodinâmica é semelhante ao nosso bolo se esfriar como esperado ou espontaneamente explodir em chamas, dependendo da temperatura exata do bolo quando ele saiu do forno,” explicou o professor Eric Hudson, da Universidade da Califórnia em Los Angeles, nos EUA.
Fenômeno físico de não-equilíbrio
Não fosse o impacto sobre os fundamentos da termodinâmica, o experimento já seria significativo o suficiente por ser a primeira vez que se demonstra haver limites fundamentais para o uso da refrigeração de gás amortecedor em armadilhas de íons, uma ferramenta largamente utilizada em laboratórios ao redor de todo o mundo.
Para realizar o experimento, o pesquisador Steven Schowalter preparou uma amostra microscópica de íons do elemento químico bário e os mergulhou em nuvens de cerca de 3 milhões de átomos de cálcio. Tudo foi resfriado a laser, sob condições altamente controladas, na tentativa de revelar propriedades da mecânica quântica que não aparecem de forma óbvia.
Os íons foram aprisionados em um aparelho que levita partículas carregadas usando campos elétricos que oscilam milhões de vezes por segundo, confinando os íons a uma região menor do que a largura de um fio de cabelo humano. Tanto a amostra atômica quanto a amostra iônica foram levadas a uma temperatura de um milésimo de grau acima do zero absoluto.
Depois de permitir que ocorressem as colisões entre os átomos e os íons, e que o sistema atingisse sua temperatura final, os físicos removeram os átomos de cálcio e mediram a temperatura dos íons de bário.
Os resultados, que mostram a existência de várias temperaturas finais com base no número de íons e na temperatura inicial, sugerem que existe um sutil fenômeno físico de não-equilíbrio entrando em ação.
Falhas na Termodinâmica
Ao tentar entender o que está havendo, tanto as simulações computadorizadas quanto as teorias da mecânica quântica parecem dar sustentação ao que se vê no experimento – embora tudo seja muito estranho para o mundo macro.
Assim, em vez de o mecanismo de resfriamento com gás amortecedor ser um processo de equilíbrio simples como se interpretava até agora, ele é na verdade um processo fundamentalmente diferenciado, de não-equilíbrio, com um comportamento dependente de elementos não previstos em uma explicação tradicional baseada nas leis da termodinâmica.
Na verdade, este é mais um experimento que dá suporte à ideia de que existem várias Segundas Leis da Termodinâmica em nanoescala, uma vez que, em determinadas condições, a Termodinâmica simplesmente falha na escala atômica.
Blue-sky bifurcation of ion energies and the limits of neutral-gas sympathetic cooling of trapped ions
Steven J. Schowalter, Alexander J. Dunning, Kuang Chen, Prateek Puri, Christian Schneider, Eric R. Hudson
Nature Communications
Vol.: 7, Article number: 12448
DOI: 10.1038/ncomms12448